sábado, 20 de dezembro de 2008

Arnaldo Matos censurado pela RTP (Outubro de 2008)


Programa da RTP "Prós e Contras" dedicado ao tema da presente crise económico-financeira.


Com um tema aparentemente tão actual quanto interessante, o referido programa revelou-se afinal uma "estucha" monumental, com sete (os seis do estúdio e mais um enviado imperial da Banca, domiciliado em Londres) "irmãos do Santíssimo" glorificando a importância estratégica da Banca privada e proclamando as ideias mentirosas de que afinal "está tudo bem", "não há problemas graves" e de que, tal como o Executivo de Sócrates logo veio declarar, "os depósitos dos portugueses estão perfeitamente seguros".


...nem uma só voz se ouviu que divergisse daquele coro unanimista e mistificatório, tendo mesmo os cidadãos portugueses - que todos os dias mais e mais têm que apertar o cinto, mesmo quando já nem barriga têm ... - que suportar o atentado à sua inteligência ...

...E, todavia, à hora do programa já alguns sabiam que o meu amigo Arnaldo Matos havia sido convidado para ele e que havia aceite o convite. E naturalmente esperavam vê-lo e ouvi-lo, bem sabendo que seria ele o único "contra" ali presente e que representaria a voz divergente do unanimismo oficial, chamaria os bois pelos nomes e diria as verdades que, sobretudo num momento como este, têm que ser ditas.

Mas a verdade é que Arnaldo Matos fora entretanto excluído do dito programa, que assim se realizou sem ele, melhor sendo então que se tivesse chamado apenas de "Prós"...


E é então que, depois de fazerem a censura mas incapazes de terem, sequer, a dignidade de assumir a respectiva autoria, os responsáveis do Programa vieram ensaiar a pseudo-explicação, tão tola quanto falsa degradante, de que tudo não passaria afinal de uma pretensa "auscultação que não corresponderia a um convite", numa demonstração de quão baixo se chegou em Portugal em matéria de Jornalismo. E isto embora depois viessem também invocar - qual rabo escondido com o gato todo de fora - que afinal, e face à curta duração do programa devida à transmissão do jogo de futebol, teriam igualmente feito uma alegada "opção editorial de convidar apenas personalidades directamente ligadas ao mundo económico" (isto, conquanto lá estivessem também professores universitários, por exemplo).


...Ora, como já tive oportunidade de escrever directamente aos responsáveis do Programa, "tal como no tempo de Ramiro Valadão, a RTP mostra assim a sua verdadeira face de "a voz do dono". Com uma diferença contudo, e bem significativa. É que os obtusos coronéis do lápis azul, ao menos, tinham a coragem e a dignidade de se assumirem como aquilo que eram: censores...".


Deste miserável acto censório, que deve ser firmemente repudiado, podem, contudo, e devem extrair-se algumas lições.

A primeira é de que este episódio pôs definitivamente a nu o que é hoje a Comunicação Social portuguesa, ou seja, um mero instrumento de propaganda da ideologia dominante onde, evidentemente, os pontos de vista divergentes não têm lugar. ...


A segunda é a de que a actual crise é afinal - e ao invés do que eles dizem - de tal modo grave que o sistema capitalista e os seus ideólogos não suportam, sequer, que no campo da mera discussão das ideias as suas posições e "explicações" possam ser sujeitas ao contraditório e ao fogo da crítica e da argumentação das ideias revolucionárias.

...............

... Em boa verdade, deixar Arnaldo Matos falar para o País inteiro, para mais num dia de grossas perdas nesses paraísos da especulação financeira que são as Bolsas, não seria deitar um balde de gasolina para um fogo de combustão lenta, seria deitar-lhe para cima uma estação de serviço inteira !


A natureza e dimensões desta crise, a denúncia dos diversos modos de acumulação pela Banca de lucros absolutamente fabulosos à custa de quem vive do seu trabalho, as medidas tomadas pela mesma Banca para repercutir nos cidadãos as primeiras consequências da crise (de que é um significativo exemplo o truque da "alavancagem" das dívidas) e o consequente agravamento drástico desta, a real incapacidade dos Bancos Centrais (passando pela Caixa Geral de Depósitos, não obstante os aumentos de capital e as vendas de acções pelo Estado, e que já representaram a entrada de 940 milhões de euros nos cofres da CGD neste último ano) para fazer face à mesma crise, a explicação da luta de equilíbrio entre dinheiro investido na produção e dinheiro existente na Banca para investir na produção e de como, quando os juros são superiores àquilo que a mesma produção suporta, a crise se torna inevitável, a demonstração de que as nacionalizações - que, como se vê, não se pondo a questão de qual a classe que está no Poder, nenhum problema trazem ao capitalismo e são até uma forma de este superar estas crises - enquanto puderem ser operadas vão aparentemente aguentando a situação mas, implicando dar mais "liquidez" aos Bancos e, logo, mais dinheiro no mercado, vão ter por resultado inevitável o aumento dos preços que, por seu turno, irá dar origem a uma crise de outra natureza, tudo isto se mostra afinal insuportável para os grandes senhores das finanças e os seus representantes que seja abertamente discutido e compreendido pela generalidade dos cidadãos.


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Garcia Pereira

10 de outubro 2008, in Semanário

3 comentários:

Anónimo disse...

É a vergonha e o decoro que já não existem em Portugal há um bom par de anos ! Tem de ser o Povo a dar um MURRO na mesa, dizer basta e......fiscalizar ! Caso contrário, e eu ainda tenho esperança que tal, num povo "manso" como o nosso", possa vir a acontecer. Excluam-se os medíocres, os oportunistas e os situacionistas (entre outros) e dê-se hipótese à Maioria Silenciosa, dos nossos dias, e talvez o rabo da Europa não se afogue em trampa !

Anónimo disse...

É o grande (!?) caminho feito por esta Europa (e não só)em defesa da Democracia...cada vez mais inexistente.
Isto um dia acaba mal...

Anónimo disse...

ainda há alguns que não têm medo.Mas os #sem medo" estão em extinção